1400-203
Lisboa, Portugal
O Museu Nacional de Etnologia é indissociável da história da antropologia portuguesa. Nele se vem a projectar uma dimensão fundamental do trabalho dos pioneiros desta disciplina no país. A partir do Centro de Estudos de Etnologia, que dirige desde 1947, Jorge Dias e aqueles que o irão acompanhar nos anos subsequentes, Margot Dias, Ernesto Veiga de Oliveira, Fernando Galhano e Benjamim Pereira, entre outros, iniciam uma pesquisa extensiva e continuada sobre os elementos da cultura material que, anos mais tarde, viriam a ser igualmente recolhidos para constituir as colecções do museu. O trajecto daquele antropólogo vai conduzi-lo e a Margot Dias ao norte de Moçambique onde, em sucessivos períodos de trabalho de campo, com início em 1957, vão construir uma sólida etnografia sobre o povo Maconde. O resultado parcial daquela investigação será objecto de uma exposição realizada em Lisboa em 1959 e é neste contexto que surge a intenção explícita da criação de um Museu de Etnologia. Em 1965 o museu é criado com o ambicioso programa de representar as culturas dos povos do globo não se restringindo, pois, nem a Portugal nem aos domínios ultramarinos sob a sua administração.
Do diversificado acervo do museu importa referir a preocupação que acompanhou a constituição sistemática das suas principais colecções. Assim foi com aquelas que se referem ao domínio da cultura material em contexto português, que corresponde a campos de investigação traduzida em monografias que fornecem o quadro de interpretação para os objectos colectados. São disso exemplo de particular relevo os estudos sobre os arados, os sistemas de atrelagem, os equipamentos associados às actividades agro-marítimas, a tecnologia têxtil, a generalidade da alfaia agrícola. Qualquer deles foi tema de livros de referência da bibliografia etnográfica portuguesa que hoje são também indispensável contributo para a história cultural de uma sociedade tradicional eminentemente agrícola que entretanto sofreu radicais transformações. Outras colecções foram resultado de campanhas conduzidas de modo a poder representar outras áreas do globo, no sentido da afirmação universalista do museu, o que aconteceu, por exemplo, com a Amazónia brasileira ou a Indonésia, entre meados dos anos 60 e começo dos anos 70.
O edifício onde o museu agora se encontra, inaugurado em 1976, permitiu dar expressão ao programa museológico que fora definido por Jorge Dias e seus colaboradores. São duas as principais ideias que o afirmam: a ausência de exposição permanente, privilegiando as exposições temporárias que permitem problematizar, aprofundar o conhecimento e divulgar junto do público colecções e temas específicos; e a organização de reservas de modo a facultar o seu acesso aos investigadores e uma percepção visual da totalidade do seu acervo. Foi esta perspectiva que igualmente defendemos, promovendo agora novas condições de acessibilidade das reservas ao público em geral, em todos os dias de abertura do museu, o que hoje acontece com duas delas, as Galerias de Vida Rural, onde desde o ano 2000 se expõem as colecções relacionadas com a actividade agro-pastoril e outras tecnologias com esta relacionadas e as Galerias da Amazónia, onde desde 2006 o público pode tomar contacto com todos os objectos provenientes de um amplo conjunto de povos da Amazónia brasileira. É aí que se encontra uma das últimas recolhas de objectos conduzida em contexto de investigação entre os Índios Wauja do Xingu, com a participação activa destes e que é também a afirmação de um programa de trabalho que desejaríamos poder estender a qualquer recolha de objectos, qualquer que seja o seu âmbito e extensão.
Nos últimos anos, o museu tem sido gratificado com o importante contributo de algumas doações, que vieram colmatar em absoluto lacunas do seu acervo ou completar conjuntos já existentes. Assim aconteceu com as máscaras e marionetas do Mali, oferecidas por Francisco Capelo, que integraram uma das exposições de grande relevo realizadas pelo museu. O mesmo se passou com duas colecções sistemáticas de olaria, que resultaram de investigações que abarcaram todo o país ao longo de vários anos; uma incidindo sobre o barro preto, da responsabilidade de Werner Tobias, outra referenciada a todos os centros de produção oleira, conduzida por Manuel Durão e Maria Helena Lemos, acompanhada de uma extensa documentação fílmica. Destacamos estas doações entre outras de menor dimensão que igualmente têm enriquecido o acervo do museu.
Uma das vertentes do trabalho do grupo de antropólogos que criou o Museu Nacional de Etnologia foi o recurso à imagem. Com eles começa a constituição de um fundo documental de capital importância para o conhecimento do país, constituído por fotografia em todo o tipo de suporte, por filme em película e, a partir dos anos 90, por gravações vídeo. Estas têm sido um meio que no museu temos procurado desenvolver, tanto em contexto de pesquisa no terreno como na documentação das múltiplas vertentes da actividade museológica e na própria formação de estagiários e jovens investigadores que connosco trabalham. Além destes arquivos de imagem também os arquivos sonoros são um campo de conservação patrimonial e de consulta parcialmente acessíveis na Biblioteca/ Mediateca do museu.
Embora tenha sido criado como instituição em 1965, o edifício onde o museu se encontra foi inaugurado em 1976. Desenhado pelo Arquitecto António Saragga Seabra, este permitiu dar expressão ao programa museológico de carácter universalista definido por Jorge Dias e seus colaboradores, valorizando o lugar determinante da investigação antropológica. Em 2000, sob proposta do director do museu, o Arquitecto Eduardo Trigo de Sousa dá forma ao projecto de ampliação do edifício, criando-se um novo espaço de biblioteca/mediateca, duas novas áreas de reserva e o jardim envolvente. As novas reservas, agora visitáveis, são inauguradas em 2000, Galerias da Vida Rural, e em 2006, Galerias da Amazónia.